Puritanos: o propósito de Deus em meio aos homens e às nações
O senso de destino que levou um grupo de imigrantes a um dos maiores projetos civilizacionais de todos os tempos.
Quero deixar claro que tenho muitas discordâncias com certos pontos da teologia puritana, principalmente na questão do calvinismo, mas algo interessante chama minha atenção, a parte positiva que eles deixaram como legado: o zelo intenso que essa irmandade protestante tinha pelo seu propósito na terra. Isso criou a convicção de que, a semelhança de Israel no Antigo Testamento, Deus estava para fundar uma nação forte e poderosa, capaz de refletir os valores que eles consideram santos: no âmbito individual, a experiência pessoal com a graça de Deus, e no âmbito público, a missão do eleito no mundo na formação da sociedade de acordo com princípios bíblicos.
A saga dos novos israelitas
Segundo a irmandade puritana, assim como Israel sofreu no deserto até conquistar a Terra Prometida, os ingleses também experimentariam uma amarga caminhada até o cumprimento do objetivo, no rastro do sangue dos mártires protestantes que levava à costa da Inglaterra, derramado por Maria Sangrenta, a cruel rainha católica.
Com a morte de Maria e a coroação da rainha Elizabeth, o fim da perseguição abriu as portas para a missão puritana ao Novo Mundo, que eles acreditavam ser a nova Terra Prometida. Isso fica evidente quando em 1630, John Cotton, pastor puritano, pregou um sermão em Southampton, baseado num texto de 2° Samuel, que dava o tom da aventura que os imigrantes prestes a partir viveriam: “E providenciarei um lugar para o meu povo Israel e os plantarei lá, para que tenham o seu próprio lar e não mais sejam incomodados. Povos ímpios não mais os oprimirão, como fizeram no início” (2° Sm 7:10).
Bruce L. Shelley, em seu livro História do Cristianismo, diz que essa ideia foi plantada por João Foxe através de sua obra O Livro dos Mártires. Depois da Bíblia, o livro de Foxe foi sem dúvida a obra que eles mais valorizaram, onde havia o conceito de que a peregrinação do povo de Deus havia atravessado os séculos e chegado, por fim, à Inglaterra. Depois da morte de Foxe, os puritanos atravessaram o Atlântico, e nas terras norte-americanas, ajudaram a moldar as bases cristãs dos Estados Unidos da América.
Lado positivo
Eles poderiam alegar que o guia supremo desta missão era o Senhor Jesus, esse pensamento pode ter ajudado na rejeição do messianismo humano, que resulta em idolatria. No conceito puritano existem valores que se provaram verdadeiros, não foi qualquer coisa desorganizada e feita nas coxas, os resultados falam por si, pois num tempo em que a América do Norte era apenas uma colônia, não dava para imaginar o que aquele projeto civilizacional se tornaria: a nação mais poderosa da terra e o modelo de sociedade que testemunhe de Cristo ao mundo.
Em certos aspectos práticos da sociedade norte-americana, evidentes na cultura e na mentalidade daquele povo, as ideias puritanas vingaram, e creio eu que o essencial do projeto foi este ter sido coordenado sem culto político. No aspecto religioso, os gestos são bem claros, presidentes eleitos jurando compromisso com o mandato com uma mão na Bíblia e a outra levantada, e no final declaram “que Deus me ajude”, o hábito acabou tornando-se uma tradição da posse presidencial. O que reforça ainda mais o sentimento cristão é o uso de Bíblias em instâncias públicas do governo estadunidense, com o intuito de marcar na mente humana a lembrança de que existe uma instância superior à justiça falha dos homens, que é a divina.
Outra parte interessante é a influência na economia, com raízes no luteranismo e no calvinismo, mas também apoiada pelos puritanos. Max Weber no título de seu livro resumiu a descrição do pensamento: A Ética Protestante e o “Espírito” do Capitalismo, o tão conhecido sonho americano de conquista das metas financeiras baseia-se nisso. A moral protestante considera o lucro fruto do trabalho do homem um dom de Deus, um prêmio por sua dedicação e austeridade, a conquista da meta financeira é vista naquele país como vitória pessoal do indivíduo, que torna-se um exemplo a ser seguido. Estes dois fatores contribuíram para a formação de uma nação próspera e uma sociedade com princípios cristãos.
Lado negativo
Porém, sobre a ideia daquele país representar o testemunho de Cristo ao mundo, faço menção do problema de crer nisso literalmente: a mácula que os EUA possuem pela sua profunda influência ocultista. Sociedades ocultistas estão em atividade desde 1700 (se observarmos com atenção, muito antes, mas nessa época mais fortemente), Maçonaria e Illuminati já estavam bem atuantes. George Washington, o primeiro presidente norte-americano, foi iniciado como “aprendiz maçom” na Loja Maçônica de Fredericksburg, Virgínia, em 1752, se tornou Mestre Maçom e permaneceu ligado à organização durante toda sua vida. Benjamin Franklin, um dos pais fundadores dos EUA, foi iniciado na Maçonaria em 1731, aos 21 anos de idade, na Pensilvânia, sendo um dos principais dignitários da Maçonaria Americana, foi Venerável Mestre da Loja As Nove Irmãs, foi dele o primeiro livro maçônico publicado nas colônias, a reimpressão da constituição de Anderson em 1733, Franklin enviou cópias desse livro para Boston e também para as Carolinas. Orações e sermões maçônicos eram publicados nas colônias nos anos 1740 e 50.
Em uma entrevista resumida num ótimo texto, Mark Tabbert e Kevin Butterfield discutem sobre a maçonaria na América Colonial, onde são mencionadas datas precisas das atividades, mas no texto percebe-se a negação da influência da irmandade nos Estados Unidos como organização, a intenção é emplacar que as ações foram feitas apenas individualmente, só que os indivíduos em questão são os mais importantes da história americana, e em alguns eventos de grande relevância a maçonaria se envolveu coletivamente, como por exemplo na declaração de independência e na construção de Washington, inclusive na nota do dólar existem referências ocultistas. Coisas grandiosas como essas dificilmente seriam feitas por indivíduos de um mesmo grupo espalhados sem qualquer plano traçado, tudo leva a crer que a maçonaria agiu ativamente nos processos.
Lojas de lugares como Annapolis, Norfolk, Filadélfia, Boston e de muitas outras partes ajudaram na expansão da organização, principalmente onde George Washington foi iniciado, em Fredericksburg, fundada em sua maioria por escoceses, era um importante porto comercial de vendedores de tabaco. Estabelecimentos como chalés e alojamentos, instituições universitárias e missões diplomáticas (como as que Benjamin Franklin realizou na época de embaixador na França) foram meios usados pela maçonaria para o seu crescimento.
Conclusão
Meu entendimento é o seguinte: tenho dificuldade com profetadas e arremedos de “cruzadas santas” que alguns grupos usam para justificar seus projetos de poder. Não concordo com a ideia puritana de que a América do Norte é a nova terra prometida e que os ingleses são os novos israelitas, pois na Nova Aliança não existe mais um país específico representante de Deus ou locais sagrados a serem venerados, “nação santa” e “povo exclusivo” são descrições do Novo Testamento para a Igreja de Cristo (1°Pe 2:9).
Mas reconheço que não é o caso de profetada aqui, pelo menos não em grande parte. A missão civilizacional dos puritanos, como podemos ver neste artigo, foi um sucesso, os valores cristãos que eles acreditavam, o modo de organização social e a representação de Cristo na vida pública criaram raízes e foram bem estabelecidas. Sabemos que existem problemas nos EUA, mazelas comuns a todos os seres humanos em todos os lugares, mas ainda assim, isso não tira o mérito da missão puritana em que eles acreditavam estar cumprindo o propósito de Deus em meio aos homens e às nações.
Autor: Magdiel Linhares.
Agradeço aos administradores do blog Informalista Brasil pela colaboração no tema da influência maçônica na formação dos Estados Unidos.
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